quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Homenageados, ex-presos da ditadura não querem desculpa 'da boca pra fora'





Cerca de 100 pessoas presas e torturadas pelo regime militar receberam nesta sexta-feira um pedido de desculpa formal por parte do Estado do Rio
André Naddeo

Ex-preso político,
Nelson Nahon aponta para a foto de uma ex-colega de faculdade,
desaparecida na ditadura 
Foto: André Naddeo / Terra


Um pedido de desculpas formal que não pode ser "da boca para fora". Este é o sentimento dos cerca de 100 ex-presos políticos da ditadura, que foram homenageados no início da tarde desta sexta-feira em cerimônia na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj). A solenidade faz parte de uma ação do Estado fluminense a fim de reparar, pelo menos em parte, os danos sofridos por estudantes e militantes da esquerda durante o regime militar.
"Isso para a gente, diante de tudo o que passamos, é um valor simbólico. O que precisamos é que isso não seja uma desculpa da boca para fora. É preciso medidas mais efetivas", afirmou a psicóloga e ex-presa política Vera Vital Brasil, uma das 790 pessoas que receberam a indenização de R$ 20 mil do Estado por terem comprovado que sofreram qualquer tipo de ameaça e tortura, física e/ou psicológoca, por parte dos militares ao longo do regime (1964 – 1985).
A Comissão Especial de Reparação (CER) foi instaurada em abril de 2004 e, ao longo de três etapas, indeferiu o pedido de 186 pessoas que não puderam comprovar, por fotos, jornais de época ou qualquer outro tipo de documentação, que foram vítimas da repressão da ditadura. "Estamos aqui para reparar um erro do Estado, concluindo um ciclo para pedir formalmente desculpas", destacou o secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, Zaqueu Teixeira.
Ele anunciou nesta sexta-feira também que a CER terá uma quarta etapa a partir do início do ano que vem e os ex-presos que não puderam fazer parte dos primeiros processos terão um prazo de 180 dias para, junto à secretaria estadual de Direitos Humanos, pedir este reparo indenizatório.
Vera Vital Brasil teve que viver seis anos no Chile, exilada
 Foto: André Naddeo / Terra


"Muita gente não conseguiu ainda ser indenizada, é importante que o Estado dê mais tempo para essas pessoas", destacou ainda Vera, que era estudante de farmácia pela UFRJ, em 1969, quando foi presa, levada para o Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi) e torturada pelos membros do regime. Detida por três meses, fugiu para o Chile, onde permaneceu exilada por seis longos anos.

"Quem passou por lá (Doi-Codi), sabe como foi. É preciso que se reative a memória das pessoas e se crie uma polícia e um aparato de segurança pública que seja banhada em direitos humanos. É inaceitável que até hoje, casos como o do (pedreiro e morador da Rocinha) Amarildo continue ocorrendo", disse ainda.

Quadro dos desaparecidos

Nelson Nahon, médico, também esteve na cerimônia com um quadro dos desaparecidos da Guerrilha do Araguaia. Ele aponta três colegas da UniRio, todos estudantes de Medicina, que por serem militantes do PcdoB, assim como Nahon, desapareceram e jamais tiveram o seu paradeiro conhecido.
"O mais importante é que seja algo que a gente nunca mais viva, nunca mais passe por isso. É preciso avançar. Como a amiga disse, não pode ser algo da boca para fora", disse, entre lágrimas, ao lembrar as torturas que sofreu nos porões do Doi-Codi e, posteriormente, no Departamento de Ordem Política Social (Dops). Foram longos oito meses e 13 dias. "Esse é o único número exato que eu lembro até hoje. Não dá para esquecer."





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