O dom de despertar no passado as centelhas da esperança é
privilégio exclusivo do historiador convencido de que também os mortos não
estarão em segurança se o inimigo vencer. E esse inimigo não tem cessado de
vencer. Walter Benjamin
É fato público, notório e vergonhoso que o Brasil é o país
mais atrasado do Cone Sul em matéria de direitos humanos. Enquanto países
vizinhos, como Argentina, Chile e Uruguai, promoveram ações de investigação e
condenação de agentes do Estado que participaram de ações repressivas durante
seus governos militares, no Brasil sequer houve a abertura dos arquivos da
ditadura. Recém tivemos a aprovação de uma Comissão da Verdade, mas que, ainda,
tem deixado a desejar no que tange a participação da sociedade civil em seu
processo de criação e, agora, de funcionamento.
No entanto, militantes, familiares, movimentos e
organizações que fazem esse debate seguem insistindo na luta de contar uma
história que vem sendo silenciada: há mais de um ano, no dia 01 de dezembro de
2010, um importante ator dessa luta, o Centro de Defesa dos Direitos
Humanos de Petrópolis, promoveu um ato-evento em comemoração dos 25 de
lançamento do livro Brasil: Nunca Mais naquela cidade. Na
ocasião, o CDDH - que tem como um dos seus fundadores o notório teólogo
Leonardo Boff e mais de 32 anos de existência como organização - entregou ao
prefeito da cidade, Paulo Mustrangi, uma moção para a desapropriação da Casa da Morte,
localizada no centro de Petrópolis e considerada por alguns historiadores o
pior porão montado pelo regime militar para as práticas de tortura, assassinato
e ocultamento de cadáveres dos opositores do regime. A única testemunha
sobrevivente de que se tem notícia é Inês Etienne Romeu, que deu um depoimento
à OAB/RJ em 1979 falando da casa - também conhecida como "Casa dos
Horrores", "Casa da Tortura" e "Codão", de onde
ninguém parecia conseguir sair vivo. Também o psiquiatra Amílcar Lobo citou a
existência do centro clandestino em seu livro de memórias "A Hora do Lobo,
a Hora do Carneiro".
Transformando o antigo espaço no Centro de Memória, Verdade
e Justiça, o desejo é operar a imprescindível tarefa ético-política de salvar o
passado do esquecimento, edificando o presente e não acatando a abordagem de um
"futuro melhor" preconizada pela famigerada Doutrina de Segurança
Nacional que justificava as práticas repressivas do Estado.
Para fortalecer as pressões pela desapropriação da Casa da
Morte, foram lançados um abaixo-assinado online e uma campanha para a
transformação do local em Memorial. O alvo da reivindicação deixou de ser tanto
a prefeitura, estando também endereçado à Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República, que tem competência para tanto. Diversos movimentos e
organizações apoiaram a iniciativa, tais como o Grupo Tortuta Nunca Mais/RJ, a
OAB/RJ, o Instituto Frei Tito de Alencar e, claro, este Coletivo, além de
militantes, familiares e outras pessoas que também querem a referida casa como
espaço de mais vida e resistência.
Mais de um ano se passou, uma série de debates públicos
foram realizados em torno da temática da abertura dos arquivos da ditadura
e, não sem dificuldade, a mobilização da sociedade e imprensa locais foram
acontecendo - a ponto do atual proprietário da casa se declarar contra a
tortura e disponível para uma aproximação.
A campanha para transformação desse nefasto centro
clandestino de tortura e assassinatos em lugar de Memória e Resistência
permanece, e é parte da necessária tarefa que temos como sociedade civil de
lembrar para que outro presente seja possível.
Assine a petição online aqui:
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